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São nove horas da manhã e já estou preparado para mais um dia de ação.
Estou sentado em meu cubículo e daqui posso ver o canto da janela da sala do fundo. Vejo que o céu deve estar branco lá fora. Sou o único homem no mundo capaz de prever a temperatura olhando apenas para 6% do céu. Sei, por exemplo, que a única chance de chover é se os sprinkles dispararem. Também não vai fazer sol, já que a luz que me ilumina é uma combinação de duas lâmpadas fluorescentes que ironicamente se chamam “luz do dia” e “branca comfort”. A primeira é ligeiramente mais amarelada que a outra. O fato é que combinadas, as duas criam uma iluminação que comprovadamente aumenta minha produtividade em 12%. Nas próximas 8 horas a temperatura será de exatos 23 graus celsius. Se o sol lá fora bater com força do meu lado do prédio, eventualmente a temperatura em minha mesa subirá para 24 graus porque o ar condicionado não dará conta de equilibrar a temperatura dos dois metros quadrados que definem minha sala. Mas isso é tudo que vai mudar. Fico mais tranqüilo em saber de tudo isso. Também me conforta o fato de saber que o meu computador está conectado a uma rede segura, protegido do acesso de intrusos por firewalls e que um no-break garante pelo menos quatro horas de trabalho, mesmo que aconteça uma guerra nuclear e o Brasil seja, sabe-lá-deus-porque, o primeiro alvo. Neste caso ou no caso de um incêndio comum, o carpete é anti-chama. As paredes e divisórias também. Os vidros são inquebráveis. Alias, olhando em volta percebo que só eu e aquela pilha de papel sulfite somos inflamáveis. Na minha frente, um leigo poderia pensar que tenho um copo de café. Alguém mais familiarizado com as idiossincrasias da minha companhia, poderia imaginar tratar-se de um expresso conseguido na máquina do segundo andar, mediante negociações com a senhora que cuida da cozinha. Mas não. Só eu sei que na verdade tenho uma mistura de achocolatado com café na razão de 3 para 1, com 3 gotas de adoçante. As vezes acho que deveria mandar patentear o modo de preparo deste elixir energizante. Só ele me faz passar o dia motivado e feliz. Ou ao menos, mantém meus olhos abertos boa parte do tempo.
A verdade é que para ocupar as horas do meu dia, tenho criado rituais idiotas, que não conto para ninguém. Como misturar água gelada com água normal para tentar encontrar a temperatura ideal. Ou passar horas organizando os objetos sobre a minha mesa, numa espécie de feng-shui minimalista.
Mas o que mais me seduz é participar de reuniões com meu bloco de anotações com o logo da companhia. É um bloquinho vertical, que só de farra utilizo na horizontal. Tem a capa vermelha para combinar com a fita onde está pendurado meu crachá.
Sento na mesa de reuniões e me preparo para a ação. Coloco o bloquinho na minha frente na posição horizontal e reparo o desconforto dos meus pares. Eles sabem que não sou como ele. Sabem que sou um outsider. O cliente entra na sala. A batalha vai começar.
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