não conte pra mamãe

27.10.06

79

A história é conhecida, mas vale como introdução: em meados da década de 80, um sujeito chamado David Gunn assumiu a direção do sistema metroviário de Nova York. Sua primeira atitude foi acabar com as pichações nos trens.
Muita gente foi contrária à atitude de Gunn, argumentando que existiam problemas mais sérios, outras prioridades e que as pichações não eram um problema relevante.
Mas Gunn insistiu que as pichações eram o símbolo do colapso do sistema de metrôs.
Assim, colocou estações de limpeza no fim de cada linha e, se o trem chegasse pichado, só poderia seguir depois que a pichação fosse removida ou o vagão pintado.
Não foi um trabalho simples.
Durou de 1984 até 1990.
Foi então que Willian Bratton assumiu a Transity Authority e decidiu acabar com os saltadores de catraca.
Assim como as pichações, os saltadores de catraca eram outro exemplo de como o sistema metroviário estava abandonado.
A polícia nem se dignava a persegui-los.
Saltadores de catraca, segundo Bratton, representam o "crime original" e, em última análise, estimulam os crimes mais graves pois transmitem ao cidadão comum a sensação de que não existe lei.
Afinal, Nova York havia se habituado com as pequenas contravenções.
As estratégias de Gunn e Bratton, combinadas, deram resultado e quase 10 anos depois o metrô havia se transformado num lugar seguro, sem pichações nem saltadores de catraca e com os índices de violência drasticamente reduzidos.
Foi quando Rudolph Giuliani assumiu a prefeitura e implantou a tolerância zero, que veio fazer com que Nova York se transformasse numa das cidades com menor índice de violência dos Estados Unidos.
Esse é um exemplo clássico de como uma idéia simples pode contaminar toda a cidade.
Não tenho procuração para defender o prefeito Gilberto Kassab.
Pelo contrário, frente à nossa história política recente, tenho um milhão de motivos para estar com o pé atrás.
Mas o fato é que alguma coisa está acontecendo.
Primeiro foi a mídia exterior.
Agora são os postes e a fiação.
Numa nota sem muito destaque, a Folha de São Paulo de 27 de outubro informou que o prefeito regulamentou a lei que disciplina o enterramento de cabos e fios.
As concessionárias terão que enterrar 250 km lineares de cabos por ano. O decreto deixa claro que as concessionárias devem reparar os danos causados e árvores serão plantadas onde estavam os postes.
Não é um projeto simples.
Vai custar mais de R$ 250 bilhões e vai levar 24 anos.
Mas é um começo.
Talvez essas atitudes tenham o mesmo efeito das pichações nos metrôs de Nova York e, para cada árvore que substituir um poste, para cada cartaz irregular retirado, um ato de violência a menos ocorra na cidade.

24.10.06

78

Acabo de conhecer o senhor Raimundo.
Apareceu no Jornal Nacional.
Cargo: afugentador de urubus na base aérea de Paraná-mirim.
É o retrato do Brasil.
Da pista decolam caças velhos, sucateados, mas que estão lá para dar a impressão de que somos um país moderno e protegido.
Na cabeceria está um nordestino tacanho, munido de seu estilengue, que revela a verdade do país.
Raimundo informa orgulhoso que faz esta função desde criança.
Assusta urubus.
É uma metafora da nossa sociedade.
Da São Paulo com seus carros importados, fingindo ser primeiro mundo.
Cercado de nordestinos, mineiros, cariocas, goianos, todos com seus estilingues em punho.

20.10.06

77

Fiquei sabendo hoje que numa pesquisa recente do Einstein, com crianças entre 10 e 12 anos de todas as classes sociais, 48% já haviam experimentado álcool, 17% cigarros e o mais espantoso: 12% já haviam tentado "outras drogas".
Sabe lá o que é isso?
Uma em cada 10 crianças de 10 anos experimentando "outras drogas"!
Neste mesmo estudo, outros dados alarmantes aparecem. A idéia de que o consumo de drogas começa em casa, com cola, com fluído de isqueiro. Ou mesmo o fato de que adolescentes dependentes são mais frequentes nas famílias cujos pais fumam, fazem a gente pensar que o cuidado deve começar muito antes dos 10 anos de idade e não tem muito a ver com razões emocionais ou genéticas.
Uma das coisas que fica clara no estudo é que as crianças devem ser ensinadas desde pequenas a encarar remédios como uma exceção. Ou seja, remédios devem ser guardados em armários e devem ser usados apenas quando estritamente necessários.
Nessa hora não pude deixar de pensar na quantidade de remédio que tenho em casa. Espalhado em todo lugar. Para dor de cabeça, para dor nas costas, para tudo hoje existe um remedinho.
E quando faço meu check-up, de seis em seis meses, ainda pior. São outros tantos receitados.
A indústria médica, o business da medicina nunca receitou como hoje em dia, arrisco dizer. É comum, para qualquer mal, você sair com um receituário para 3 ou 4 remédios diferentes e ainda uma sugestão de seu médico para visitar um endocrinologista, ou um dermatologista para ver essa manchinha e toca mais remédio.
A mesma medicina que descobre que os remédios devem ser contidos é a medicina que nos estimula a consumir em excesso.

9.10.06

76

Minha geração, essa dos quarenta e poucos, não deu praticamente nada ao mundo.
Somos muito jovens para os hippies e velhos demais para os punks.
Ok.
Ninguém nos tira o The Police, é verdade.
Muito pouco, convenhamos.
O mais perto que chegamos de um movimento cultural memorável foi com os Yuppies, pobre de nós.
Este final de semana, no entanto, assisti ao documentário Dogtown and the Z-Boys, dirigido por Stacy Peralta e não pude deixar de me encher de orgulho.
Afinal, descobri que nossa geração fez algo mais de memorável: críamos o esporte radical.
Ou ao menos sua versão sobre quatro rodinhas.
Dogtown é o fim ou o começo da Route 66. Um lugar inóspito, cercado de bairros ricos de Los Angeles, cuja geografia dos dutos de água, das piscinas semi-esféricas, da proximidade com o mar somados a uma seca histórica, possibilitaram que o skate, um brinquedo da década de cinquenta ressurgisse no início da década de 70 com força total.
Z-Boys eram os garotos patrocinados pela Zephyr, uma surf shop local. Entre eles estavam Jay Adams, Tony Alva e o próprio Stacy Peralta.
Os três reinventaram o esporte. Jay redefiniu o street. Alva praticamente inventou o vertical e os aerials.
Dos três, Jay era o mais talentoso. Hoje cumpre pena no Havai por envolvimento com drogas. Alva tem sua marca de skate e Peralta dirige documentários.
Este é especialmente comovente.
Tem narração de Sean Penn e mostra com cenas reais o que o filme Lords of Dogtown romantizou.
Tem que ser visto.

2.10.06

75

Um país que elege:

Clodovil
Paulo Maluf
Frank Aguiar
Enéas
Collor
José Genoino
Sandro Mabel
João Paulo Cunha
Valdemar Costa Neto

Merece ter Lula presidente.
Merece pagar um dos maiores impostos do mundo e não receber serviço nenhum em troca.
Merece ter máfia de ambulância, ter mensaleiro e todo tipo de ladrão de terno e gravata.
Merece que roubem até nosso último centavo.

Não aprendemos nada.

Não temos o direito de ser uma democracia.
Somos um país de maioria ignorante.
Enquanto não houver educação mínima ou voto qualificado, desconfio que seja melhor ter um déspota esclarecido, cuidando de nossos interesses.
É melhor do que entregar a um povo que não sabe escolher, o direito ao voto.

Prefiro um ditador esclarecido a um ignorante ladrão.

74

Acabo de saber que haverá segundo turno.
Não imaginava, sinceramente.
Junto com a pontinha de esperança, veio a decepção de saber que os dois deputados mais votados em São Paulo são Paulo Maluf e Clodovil.
Eta povinho burro.
Collor também ganhou para o senado.
Não se iluda.
O futuro é negro.
Lula tem 49% dos votos.
Só precisa de 2 pontos para se reeleger.
Ou seja, mesmo com todos os votos de Heloisa Helena e todos os votos de Cristovam Buarque, ainda assim é difícil ganhar de Lula.
O PSDB vai precisar de algo mais.
Vai precisar de mais escândalos.
Vai precisar de mais barulho.
Vai precisar tirar votos de Lula.
Caso contrário teremos Lula presidente, Maluf deputado e Collor senador.
Estamos bem arranjados.